4.5.08

Meu caleidoscópio

Meu caleidoscópio, quantas cores tinha, iluminadas pelos raios de sol - atravessando o vitrô em prisma sobre as violetas - já chegavam coloridos antes mesmo de atravessarem as lentes dos óculos de minha avó; assoviando uma sinfonia qualquer, lépida cozinhando, enquanto a chaleira teimava em destoar com seu apito agudo.

O cheiro do café se espalhando pela casa nos carregava ainda zumbis envoltos nas cobertas até a mesa onde as cabeças apoiadas sobre as mãos derretiam-se como pão no leite.

Das tardes mornas, guardo o cheiro dos armários que tantos gostos doces de infância escondiam. As folhas úmidas do quintal e a serragem no meio da horta com morangos espalhados pelos pés cheirando a molecagem.

Casas de árvore com formato de girafa, piscinas de folhas secas. Plantas que adormecem enquanto os adultos dormitam e mais um passeio de bicicleta, antes tão distantes, hoje traçados por pneus muito mais velozes.

O sol começa a baixar e o banho de banheira vira uma festa onde sempre cabe mais um e o banheiro acaba por se transformar em um imenso parque aquático. Os sabores do almoço se misturam aos embutidos de meu avô numa mesa farta de gargalhadas. Mais um dia se vai e já é hora de recolher as alegrias na casa que hoje, depois dos escombros, se reergue em dezenas de pequenos cômodos amontoados, esmagando meus sonhos infantis, derrubando meus quintais de brincadeiras sortidas, tornando a cidade mais adulta.